Buscar Refugio
Busco refúgio em Buda, que me mostra o caminho nesta vida.
Busco refúgio no Dharma, o caminho da compreensão e do amor.
Busco refúgio na Sangha, a comunidade consciente e harmónica.
Nós vivemos num mundo que é impermanente e repleto de sofrimento, e sentimo-nos inseguros.
Desejamos permanência, mas tudo está sempre a mudar.
Desejamos uma identidade absoluta, mas não há entidades permanentes, nem mesmo aquela a que chamamos de nosso “eu”.
Buscar refúgio significa, em primeiro lugar, buscar um lugar que esteja fora de perigo, que seja permanentemente seguro, que possamos confiar por muito tempo.
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O desejo de buscar refúgio e de retornar a um local que seja seguro e fora de perigo é universal. Em vietnamita, as palavras para “buscar refúgio” são literalmente “voltar e confiar”.
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Mas como podemos nos sentir seguros agora se as coisas são impermanentes?
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No budismo existem dois tipos de práticas: a devocional e a transformadora.
Praticar devoção é confiar primeiramente no poder de outro ente, que pode ser um Buda ou Deus.
Na prática transformadora você confia mais em si mesmo e no caminho que está a seguir.
Ser um devoto do Dharma é diferente de praticar o Dharma. Quando você diz: “Tomo refúgio no Dharma”, você pode estar a demonstrar a sua fé no Dharma, mas isto não é a mesma coisa que praticar o Dharma.
Dizer: “Eu quero tornar-me um médico” é uma expressão da sua determinação de praticar medicina mas para se tornar um médico, você tem que passar sete ou oito anos a estudar e a praticar medicina.
Quando você diz: “Busco refúgio em Buda, no Dharma e na Sangha”, isto pode ser apenas a sua intenção de praticar. Não é porque você fez esta afirmação que você já está a praticar. Você entra no caminho da transformação quando você começa a praticar aquilo que pronuncia.
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Mas pronunciar palavras tem um efeito, sim. Quando você diz: “estou determinado a estudar medicina”, isto já tem um impacto na sua vida, mesmo antes de você se dirigir a uma escola de medicina. Você quer fazer aquilo e por causa da sua determinação e desejo, você encontrará uma forma de ir à escola.
Quando você diz: “Tomo refúgio no Dharma”, você está a expressar a confiança no Dharma. Você vê o Dharma como algo benéfico, e quer se orientar naquela direcção, isto é devoção.
Quando você estuda e aplica o Dharma na sua vida diária, isto é uma prática transformadora.
Em toda a religião existe a distinção entre práticas devocionais e transformadoras.
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Alguns meses antes de morrer, Buda ensinou os discípulos dele a buscar refúgio em si mesmo.
“Bhikkhus, sejam uma ilha dentro de si;
Não busquem refúgio em nada mais;
Tomem refúgio no Dharma;
Usem o Dharma como as suas lâmpadas;
Usem o Dharma como suas ilhas”.
Ele preparou-se muito bem para a morte.
Buda disse:
“O meu corpo físico não estará aqui, mas o meu corpo dhármico (Dharmakaya) estará com vocês para sempre. Se quiserem tomar refúgio no meu corpo dhármico, vocês podem fazer isso a qualquer momento”
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Se soubermos tocar o Darmakaya, ele estará disponível para nós, para os nossos filhos e netos a qualquer momento.
Compreender claramente que o corpo físico não é tão importante quanto o corpo dhármico foi um conforto para os discípulos de Buda.
Hoje em dia, há tanto sofrimento e perigos dentro da nossa sociedade; é como uma forte corrente tentando nos puxar para dentro do oceano de aflição. Para nos protegermos, também podemos praticar sendo ilhas dentro de nós.
Um (ou uma) Buda só pode ser um (ou uma) Buda quando o Dharma está dentro dele (ou dela). Sem o Dharma, ninguém pode ser chamado de Buda.
Buda e Dharma são dois, porém um.
Buda não existe sem o Dharma. O Dharma não pode existir sem um Buda.
Uma Sangha é uma comunidade que pratica o Dharma. Se não houver Sangha, quem praticaria o Dharma? O Dharma não será palpável se não houver praticantes.
Se você quiser que o Dharma seja praticado, você precisa da Sangha.
A Sangha, portanto, contém Buda e Dharma.
Buda, Dharma e Sanga interexistem.
Eles poderiam ser chamados da Trindade Budista: triratna (ou ratna traya), as Três Jóias. Na triratna, cada jóia contém as outras duas.
Quando você toma refúgio em uma, você toma refúgio em todas as três.
Quando você confia e tem fé na Sangha e pratica com uma Sangha, você está a expressar a sua confiança em Buda e no Dharma. É crucial praticar os Treinamentos da Consciência Plena com uma sangha, uma comunidade de praticantes. Você precisa de uma Sangha para ter apoio à sua prática.
Uma verdadeira Sangha sempre possui Buda e Dharma no coração.
do livro ‘For a Future to Be Possible’ – Thich Nhat Hanh